Nesse exato momento o Sergio, do Vento Real, está na posição 23º08'366'' S, 43º 42' 358'' W. Traduzindo para o vernáculo ele está em frente ao Recreio dos Bandeirantes, no Rio de Janeiro, indo em direção a Paraty.
O Capitão, como eu o chamo, é um sujeito ímpar. Caiçara de Paraty, nasceu no sítio que fica na praia do Engenho, aquela vizinha à Jurumirim dos Klink e onde seu irmão tem um bar até hoje. Lá também seu irmão de criação, Aldo, mantém um estaleiro artesanal.
Passou a infância em barcos de pesca na baía da Ilha Grande e a vida em plataformas da Petrobrás. Na aposentadoria construiu um MC 31 sozinho, em um terreno no Rio do Meio em Gaurujá, ao longo de nove anos. O barco foi para a água em fevereiro de 2014. As velas ficaram prontas no útlimo dia de julho.
Fez uma unica velejada teste, indo até a laje de Santos e nos primeiros dias de agosto, ele que era muito mais construtor do que velejador, deixou o cais da Boreal, sozinho. Sua ideia era navegar perto da costa, apenas durante o dia. Logo viu que não seria possível. Como não conseguia dormir e acordar em intervalos curtos, aprendeu a ficar longos períodos acordado (mais de um dia inteiro!).
Sozinho e com o cinto de segurança (emprestado pelo Alan) devidamente guardado em um dos maravilhosos armários do barco, ele chegou em Recife. Antes entrou em Aracaju, à noite. No dia seguinte, ao ver o tamanho das ondas e a confusão que era aquela barra, fez a si mesmo duas perguntas. A primeira: "- Como eu entrei aqui?". A segunda, talvez mais importante: "-Como eu sairei daqui?". Saiu.
Ao longo da viagem disse que o vento mais forte que pegou foi de vinte e cinco nós, mas que na maior parte do tempo a coisa ficava entre dez e vinte, constantes e na cara. Ainda no través de Olinda descobrimos que o aparelho estava com defeito e registrava a velocidade do vento reduzida à metade. Nada como não saber; nada como não ligar. No dia dos vinte e cinco nós ele enrolou um pouco a genoa e colocou a mestra na segunda forra, mas que ele achava ser a primeira.
Quando cheguei em Recife o Capitão era celebridade no Cabanga. Conhecido e querido por todos. É assim onde ele passa. Para ele a Refeno foi passeio no parque, até porque pôde dormir por mais de uma hora seguida, mais de uma vez. Depois de tanto tempo em solitário seu maior desafio deve ter sido receber três tripulantes (um deles eu, inesperado e quase desconhecido). Ainda assim foi amável e generoso. O que era dele, era nosso. Ralhou comigo algumas vezes, é verdade. Mas vi isso mais como malcriação de pai do que qualquer outra coisa. Lembro bem que quando entrei no ônibus para ir para o aeroporto em Noronha ele me abraçou e pediu "desculpa por qualquer coisa". Achei aquilo de uma simplicidade tão extrema que fiquei de certa forma comovido. E grato. Desculpar o que, se ele havia me levado velejando até Fernando de Noronha???
Depois da Refeno o Capitão fugiu da Marinha (ops!). Saiu antes do permitido da ilha e com rumo à João Pessoa, ao invés de Natal (ops!²), sob um vento (real) de mais de trinta nós, agora sabidos. Lá a Leila e o Alan desembarcaram e ele voltou a ser um navegador solitário. Depois de alguns dias e fazendo pernas cada vez maiores começou uma descida que amanhã de manhã deve terminar na praia do Engenho, onde passará as festas de final de ano com sua família, sem fazer alarde e sem saber que fez algo que se pensarmos bem, era impossível.
Muito bom, o que precisamos é romper as raízes
ResponderEliminarAno que vem é sua vez, Ulisses!!!
EliminarMuito legal a narrativa , Juca.
ResponderEliminarSem saber que era impossível, foi lá e fez!!
Deus ajuda!!!
EliminarMuito bom Juca!
ResponderEliminarMais um capítulo do livro!
Abraços
É verdade! Mas o capítulo que eu mais espero é o de janeiro, rs!
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