Like a roling stone...
Houve um momento muito interessante nesse terceiro e último dia a bordo: quando nos demos conta de que Natal estava mais distante do que Noronha. A capital do Rio Grande do Norte distava cento e vinte milhas de onde estávamos, ao passo que Noronha "apenas" noventa. Foi meio estranho imaginar que estava tão longe de terra, algo equivalente a distância entre Guarujá e Paraty. Além disso a profundidade onde navegávamos era de míseros quatro mil metros! Esses números nos fazem pensar em terra. Mas lá, no mar, a coisa soa tão natural que até chegam a não dizer nada.
O "Triunfão" estava silencioso. Chamou logo cedo, mas a propagação estava ruim e não copiou nossa resposta. Antes do almoço golfinhos roteadores fizeram um show na nossa popa. As aves marinhas passavam para lá e para cá. Na madrugada uma delas tentou pousar em nosso bimini. Para ajudá-la eu coloquei a lanterna em sua direção, mas acho que não deu muito certo pois ela se estatelou no mar...
Ao meio dia vimos algo inesperado: velas ao vento, a nossa popa! Veleiro a vista!!!
O vento baixou. Dos 25 nós da madrugada "despencou" para 15, depois 10, depois 8... Ora, isso não se faz!!! Interessante como nossos parâmetros mudam. Em Ubatuba o ventão da madrugada seria convidado a se retirar. Aqui era desejado com ardor. Tiramos o rizo da vela mestra.
As velas do outro veleiro mantiveram-se a nossa ré, à boreste. Sempre na mesma marcação, o que indicava que a velocidade era a mesma. Almoçamos e fomos vistados por baleias piloto. Pena que a câmera nunca está a mão nessas horas.
Curiosos por saber quem estava a nossa ré - no visual e fora dele - bolamos estratégias. O Capitão Sergio pensou em fingir ser outro barco, o USS Pernambuco, da Marinha dos EUA. Acho que não enganaríamos o valente "Rebocador de Alto Mar Trinfo" por muito tempo.
No fim da tarde, então, algo miraculoso aconteceu: as velas que nos seguiam no horizonte começaram a ganhar uma velocidade sobrenatural. A medida que o vento caia, mais elas andavam. Desceram no vento e terminaram bem a nossa frente, no rumo direto da Sapata. Mais do que isso: começaram a abrir distância! Quanto menos vento havia, mais eles andavam. Mistérios... mistérios... mistérios...
Não vimos Noronha chegar durante o dia. A 25 milhas - quando em geral se começa a ver terra - não se via nada, nem as nuvens que ficam por cima das ilhas oceânicas.
Anoiteceu. O vento subiu para quinze nós e o veleiro superandador a nossa frente começou a andar menos. Manteve-se a uma milha de nossa proa. Eu estava no leme e me guiava usando sua luz de mastro. Eram 20h30 quando um clarão se fez ver no horizonte. Terra a vista. Foi um momento sereno, quase natural - muito diferente do que eu pensei que fosse. E eu não estava ouvindo Like a roling stone...
Pouco depois mudamos para o canal 77 e ouvimos o valeiro misterioso anunciar seu nome: "CR, CR, aqui Jamaica III, Montamos a Ponta da Sapata". Hum, era ele, o Jamaica III!
Quando montamos a Sapata entreguei o leme ao Capitão Sergio. A honra de chegar em Noronha deveria ser dele. Afinal foi ele que em solitário saiu da Boreal em uma manhã chuvosa de sábado e levou o barco sozinho até Recife. Foi ele quem gastou nove anos de sua vida fazendo aquele barco. E fez tudo isso como se fosse a coisa mais normal do mundo. O Sergio é um homem verdadeiramente do mar e merece minha mais profunda admiração.
Eu imaginava Noronha como uma ilha monstruosa, saindo do mar e indo raivosa em direção ao céu, ganhando as alturas. Mas não. Ao chegar ali o que encontrei foi uma "pedrinha" tão bela, quanto frágil. Ilha que é quase ilhota. Delicada. Pequenina. Baixinha. Uma sillhueta de Niemayer no meio da escuridão do deserto do oceano.
Pelo rádio acompanhamos a chegada do Jamaica III e soubemos que um veleiro que estava atrás de nós desistiu e ligou o motor. O Tartaruga seria do jamaica III e foi melhor ter sido assim, para alegria do nosso Capitão que relutava em aceitar a honraria.
Menos de meia hora depois de montarmos a Ponta da Sapata ouvimos no canal 77:
- Veleiro que se aproxima da CR, identifique-se.
- CR, aqui Vento Real - respondeu o Alan.
- Vento Real, você consegue ver a linha de chegada?
- Afirmativo.
- Vento Real, ilumine suas velas.
Houve um breve silêncio e então as palavras que eu nunca irei esquecer:
- Vento Real, bem vindo a Fernando de Noronha.
Galeria:
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Muito legal a sua Narrativa, Juca. Parabéns pela regata!!
ResponderEliminarAbraço!!
Grrrraaaaaaaaaannnde Ricardo!!!
ResponderEliminarPena vc não estar lá com a gente!
Esse fds vou para Ubatuba! Vamos tomar uma... coca!
Bons ventos!
Venha Sim, só que nem coca gelada tô tomando, já que estou no estaleiro com rinite, sinusite, alergite, dor de gargantite entre outros 'ites'....que tal um chá quente?? kkkk ô decadência!!!!...
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