Quem frequenta as praias do litoral norte paulista e sul fluminese tem uma relação íntima com a Rodovia Rio Santos, a "infinta highway". Com pista simples e cheia de curvas, a estrada nos provoca as sensações mais variadas e ouso dizer que ela é um passeio dentro do passeio. Mata atlântica por todos os lados, cachoeiras aqui e ali, a "muralha" da serra do mar acolá e de tempos em tempos vislumbres do mar de tirar o fôlego.
Para ir até Ubatuba eu a pego desde o seu fim, em Santos, no quilômetro 246. O Saco da Riberia está no quilômetro 62. Desde a travessia de balsas até o pier da Ribeira são exatos 199 quilometros, que quando não há trânsito temos feito em três horas e meia.
O trecho mais íngreme é a serra entre Boiçucanga e Maresias. Sete quilômetros de suplício; o mais lento vem logo a seguir, entre Maresias e o centro de São Sebastião. Vinte quilômetros de curvas para lá e para cá, a uma velocidade média de cinquenta quilômetros por hora. Esse trecho, apesar da baixa velocidade, é um dos mais belos, pois é elevado e traz vistas senacionais do mar, das ilhas ao largo e da Ilhabela.
É nesse pedacinho da estrada que fica uma obra de arte pouco convencional e genial. Em uma das curvas há um muro e é evidente que esse muro não foi erguido sem razão. A curva fica em um barranco e logo abaixo há uma dezena de casas de veraneio e não devem ter sido poucos os carros que voaram por ali. Mas antes do muro havia uma das mais belas vistas do litoral de São Paulo - sem exageros.
Não, a obra de arte não é o muro. Aliás, o muro é bem sem graça: feito de blocos, revestido com cimento e com arame farpado em seu topo, é um emblema da civilização humana, que teima em trazer o cinza pálido para onde quer que vá, para onde quer que invada.
A obra de arte é uma pixação feita no muro. Não, não falo de um grafite. Falo de uma pixação das mais ordinárias, feita com "spray" verde musgo e que em qualquer outro lugar seria apenas um ato de vandalismo. Acontece que se a forma não é a mais adequada, o conteúdo redime seu pecado original: "Cade o horizonte?", é o que ela nos indaga, franca e cruel como um soco no estômago.
O ser humano é um animal contraditório. Conquista o território; loteia o território; se instala no território e, depois, teima em criar mecanismos a artifícios que o prendam ali: uma cerca, um muro, um arranha céu. Matar o hozironte é o mais eficaz deles, afinal ninguém quer estar em um lugar que não vê. Um muro é controle. Não porque impede as pessoas de ir para outro lugar, mas porque antes as impede de ver outros lugares. Navegadores são seres diferentes. Não gostamos de muros.
Que bom seria se em terra fosse como no mar! Sem muros!
ResponderEliminarAbraços
Bons ventos e estrelas à barla!
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