terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Vento, ventania!

Boas!

Cheguei em Ubatuba na última sexta-feira (22), pois iria dar aulas de vela para uma família no sábado e no domingo. No caminho recebi um torpedo do marinheiro avisando que estava ventando forte e que ele iria soltar o ferro do Malagô, por segurança, já que a poita não inspirava muita confiança. Fiquei um pouco preocupado, mas confesso que nunca sei (ou sabia) quando esse lance do vento forte é algo real ou apenas papo de marinheiro querendo ser diligente. Em poucas horas eu saberia...

Desci do ônibus às 18h00 (quando eu vou sozinho vou de ônibus, pois eu dirijo muito mal). Nada de vento. Xinguei em pensamento e fui direto para o barco para dar uma geral, deixar a mochila e depois ir comprar água, bebidas e uma pizza que planejava dividir com o Erom e a Selma, meus vizinhos que moram a bordo do veleiro Gigante (um Brasilia 27). 

Mas quando a gente chega tem sempre uma coisinha para fazer aqui, outra acolá... nisso escureceu. Logo em seguida, começou a chover. Achei melhor chamar a AUMAR no canal 73 e ir logo para terra buscar o rancho (eu tinha saído de casa sem almoçar e a situação estava crítica). 

Não deu tempo.

A chuva virou uma profusão de pingos do tamanho de bolas de boliche (com uma pequena licença poética) e o vento entrou. Meu pai do céu: que vento! Os estais rugiam, o velho Mala tremia todo e eu peguei a calça marrom.Raios por todos os lados e dava para ver tudo em volta, apesar de ser noite. Por sorte estava sem o toldo e o barco não balançava muito (ao contrário do Gigante, que deitava nas ondas formadas pela ventania. O Piano Piano (Vivre), valente que só ele, também dava seus mergulhos. 

"- E a poita, vai aguentar?" - eu pensava a todo instante, apenas com dois olhinhos para fora. Liguei o VHF para monitorar a situação, acendi a luz de tope e esperei, com muita sede e muita fome. Pelo menos eu estava ali: se a poita não aguentasse, o ferro estava solto. Se ele falhasse, eu ligaria o motor e eu parei a sequência por ai.

Quase liguei para meus alunos, pois o clima não era do mais amistoso. Ainda bem que não fiz isso.  Depois de três horas a bandeirinha voltou a tremular levemente e o bimini parou de querer decolar. A poita aguentou - passou no teste) e as estrelas surgiram no horizonte. Infelizmente, para mim, era mais de dez da noite e tudo já estava fechado por aquelas bandas. Fui dormir,m depois de comer jornal e me enrolar em papelão (como bom mendigo do mar).

No dia seguinte, após um café da manhã de rei recebi o João Paulo, a Valéria e seus belos e maravilhosamente bem educados filhos João Vitor e Ana Júlia, que me lembrou muito a fase criançola da minha Bridinha (hoje ela está ficando mocinha, às vezes meio sem graça e aborrecida como todo adolescente em formação, rs).

O Mala ficou todo animado. "- Juca, hoje vamos velejar" - me confidenciou. Na primeira rajada deitou o costado de bombordo na água e decolou a sete nós. Que delícia!!! Mas a Valéria deu sinais de que não estava muito confortável e então era hora de adaptar. Tem que ser divertido para todo mundo, em especial para a Almiranta! E adernar muito não deixa nenhum marinheiro de primeira viagem tranquilo. Nisso o curso virou charter: velejamos, paramos para mergulhar, fizemos trilhas, comemos sanduíches e depois do banho quente na AUMAR, churrasco e cama.  

No dia seguinte fomos para a Ilha Anchieta, velejamos mais um bocadinho (só de genoa, para não assustar ninguém), num dia de céu azul sem nuvens, mar de almirante e uma lestada de seus confortáveis dez nós. E pensar que eu estava lá a trabalho!

Só não digo que foi perfeito porque eu sinto muito a falta das meninas - por mais que elas espalhem as quinquilharias mais inusitadas no nosso convés. Porém o Mala precisa de muitas coisas e a receita do curso de vela vai toda para a aquisição de materiais e manutenção do danado - a começar pela poita, cujos cabos já mandei substituir. Agora é a vez das catracas... (ai meu saldo, haja aula!!!)

Nesse final de semana tem mais!

Vamos que vamos!!!

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Havia uma ponte no meio do caminho!

Boas!


Há mais de uma forma de se fazer as coisas, quase sempre. Aqui na região de Santos as vagas para veleiros são um problema. São poucas, em especial para barcos pequenos e, quando existem, são muito caras. Eu já disse muitas vezes que só consigo ter barco aqui por causa do Chinen (que ainda tem um preço mais ou menos razoável).

Enquanto alguns aceitam isso sem brigar (como eu, rs), outros - como os velejadores de São Vicente - nos lembram que a necessidade é a mãe da invenção. Na região do mar pequeno, que nada mais é senão a parte de trás da Ilha de São Vicente (onde coexistem as cidades de Santos e São Vicente) existem muitas marinas, porém todas voltadas para lanchas.

O motivo de não haver muitos barquinhos mastreados por lá é a baixa altura da Ponte Pênsil, que não chega a cinco metros. 




Porém os problemas desse pessoal pelo que parece "se acabaram-se"! Como me contou o "Marujo Cardoso" no Facebook:

"Aí Juca, estamos superando as dificuldades de passar debaixo da Ponte Pênsil de São Vicente, ainda precisamos fazer uns ajustes, tais como como colocar uma barra na base do mastro, para servir de alavanca (mão francesa) e os moitões para redução, mas já conseguimos sair da baía de São Vicente para as costeiras do Guarujá sem problemas, a não ser força física, dos 2 veleiros o Ranger 22 por ter o stopper da mestra na base inferior à ré, o mastro tem que ser removido da base para ter ângulo adequado para passar debaixo da ponte, mas já tenho projeto para evitar estes sacrifícios físicos, já que o preço da garagem náutica daqui, está até o presente momento compensando o sacrifício".


Para completar graças a esse post o pessoal conseguiu ajuda do Eduardo Moura, do Veleiro Bearship, um dos veleiros de cruzeiro mais bem mantido e equipado de nossas águas. 

Cabe aqui um mea culpa, pois quando consultado a primeira vez sobre esse sistema me mostrei cético por demais.  Paguei minha língua: os meninos conseguiram e, com isso, criaram uma nova opção para a guarda de veleiros pequenos na região!

Bons ventos em São Vicente!

domingo, 17 de fevereiro de 2013

Vela Santista e ABVC em Santos

Boas!

A vela em Santos passa por um período interessante. As pessoas estão mais gregárias e colocando o foco não apenas em regatas, vocação mais ou menos óbvia de uma região que tem uma boa raia mas que a primeira vista não tem muitas opções de passeios. 

Um primeiro sinal disso foi a feliz nomeação de Volnys Borges Bernal (veleiro Jazz 4) para uma inédita vice-presidência da ABVC em Santos. Apesar de haver muitos veleiros  por aqui (e, s.m.j., onde há veleiros, há cruzeiristas em potencial), para aquela instituição Santos/Guarujá, até bem pouco tempo era apenas uma escala do Cruzeiro Costa Sul. A ABVC tem um grande potencial na difusão da vela de lazer.

Em paralelo às ações da ABVC, a flotilha santista tem se organizado de forma mais ativa e animada. Em 2013, além da regata de aniversário da cidade, já houve um passeio de carnaval e um belo churrasco de confraternização na praia do Sangava (que eu nem acredito que perdi!). Além disso todas essas ações têm  sido divulgadas além dos "muros" do Clube Internacional de Regatas, o que é extremamente positivo e democrático!

Acompanhe a Vela Santista!

Praia do Sangava, em Guarujá: uma das opções de passeios na região. (c)  Blog Vela Santista

E vamos no pano mesmo! 

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Mais uma festa a bordo!

Todos os dias eu e a Pri levamos  as meninas para as respectivas escolas, logo depois do almoço. São duas quadras de caminhada, mas é um dos "nossos momentos" (e quem te filhos pequenos sabem que eles somem da vida de um casal com relativa facilidade).

Em um desses dias a Priscila  parou - mesmo com toda a pressa que estávamos - e alheia a tudo em volta cheirou um flor que nascia em um canteiro de uma das casas do caminho. Depois seguiu cantarolando com um sorriso de criança.  

E mais uma vez eu lembrei porque casei com ela...



Feliz aniversário, Almiranta. Amo você.

Com chave?

Boas!

Finalmente levei as meninas para conhecer a nova casa do Malagô: o Saco da Ribeira.  Saímos de Santos na sexta pela manhã e seguimos sem trânsito algum até Ubatuba. Ficamos até hoje cedo e quatro horas depois, estávamos em casa. Pelo visto as comemorações de carnaval passaram longe do litoral norte de São Paulo. Estranhamente e felizmente, a chuva também. Com exceção de uma garoazinha em uma ou outra madrugada, fez sol todos os dias, ventou e o mar estava incrivelmente baixo. Eu sempre digo que é preciso saber valorizar os dias perfeitos. Eles são poucos e às vezes na correria da vida moderna a gente sequer os reconhece. Esse carnaval foi especial: foram seis dias perfeitos e em sequência.


Meu roteiro faria o Walnei, do veleiro Vivre (ainda travestido de Piano Piano) ter calafrios! Ele, que traçou uma verdadeira romaria pelas praias de Ubatuba no ano novo com seu valente Cruiser 23, ficaria surpreso ao ver que com nosso 40 fomos primeiro só até ali, literalmente: praia do Flamengo, a menos de um quarto de milha da poita!  Mas é isso mesmo, afinal eu sou especialista em ir só até ali - e voltar!

A propósito, o Lauro Valente fez um excelente post em seu blog que tem muito a ver com o que passamos nesse feriado: às vezes os lugares mais legais estão ali, ao alcance das mãos, principalmente quando as pessoas que nos são mais caras e amadas estão  a um palmo ou dois de distância. Claro que viagens longas como o CCS (Cruzeiro Costa Sul, organizado pela ABVC) que o Paulo do magnífico veleiro Bepaluhê está se preparando para ir são momentos ímpares na vida do velejador. Mas o ponto é que não é preciso fazer isso todos os finais de semana para ser feliz no mar!



 Nesses dias fizemos churrasco, mergulhamos, conversamos e dormimos, não necessariamente nessa ordem, tudo meio junto e misturado, alheios a um mundo que se deparava com a seguinte dúvida: ex-Papa participa do conclave?

Quando saímos de Paraty o fundo estava tinindo de limpo. Mas em menos de vinte dias já trazia cracas, algum limo e muitos pólipos - como eu odeio esse negócio! Mergulhei na Ilha Anchieta (o ponto mais distante que nosso "só até ali" permitiu ir) e senti um pouco de saudades do Cusco Baldoso: limpar o fundo de um 23 pés é infinitamente mais fácil do que enfrentar sete metros só de patilhão, a um metro e oitenta de profundidade! Mas missão dada, missão cumprida. Daqui a vinte dias tem mais...


Eu gostei muito da região. Do ponto de vista didático - curso de vela - percebo que ela tem muito potencial, em especial para o tipo de velejador que eu pretendo formar, ou seja um cruzeirista que saiba velejar bem e que não ligue o motor no primeiro perrengue ou calmaria: a) o vento está logo ali e não depois da Ilha do Mantimento (Paraty);  b) o regime de ventos me lembrou muito o da baía de Santos, onde me formei velejador; c) voltar para a base sem o motor é uma possibilidade concreta (ao contrário do que seria no Canal de Bertioga, já que o mar fica a uma boa horinha de navegação do Chinen, às vezes contra uma maré bem forte); d)  além disso, existem lugares lindos para ancorar e dar um mergulho ou, no mínimo, fazer uma refeição com um belo visual (valor que faço questão de agregar ao curso).


É claro que nem tudo são flores. Percebi que existe uma certa bagunça organizada típica de faroeste. Networking, ao que parece, é um "social skill" muito  necessário por lá. Isso por um lado me agrada, pois eu não gosto de paparicação de marinheiros de marina - das minhas coisas cuido eu e isso inclui minha bagagem; mas por outro não gosto de "ter que ter" um marinheiro para conseguir água para os tanques, nem de receber um orçamento (muito) diferente em menos de duas semanas em uma mesma loja ... Enfim, eu já estou nisso há tempo bastante para saber que cada lugar tem seus defeitos e suas virtudes. O importante é que no final, bem feitas as contas, o resultado seja positivo. 

Já estou dominando o Velho Mala. Toquei ele sozinho - no pano mesmo -, enquanto as meninas tagarelavam.. Achava que não seria possível sem o piloto automático, mas assim como o guincho foi só prestar mais atenção no barco. Quando se solta a roda de leme ele mantém o curso por um tempão, o suficiente para colocar o barco em uma orça mais ou menos aceitável. Ah, que prazer foi depois de tanto tempo velejar para lá e para cá, sem destino certo, sem motor, sem quase nada a não ser o vento nas velas e meus amores me mandando beijos lá da proa (onde eu ia, de quando em vez, beijá-las também).

O Mala tem dois jogos de vela completos (mestra, genoas I, II e III e balão). Um desses jogos é de gala, que pertenceu ao Ondina, o mais célebre dos "Brasil", numeral BL 13 e está muito bom. O outro já mais surrado fica para uso diário. Só que o Cesár cometeu um pequena heresia: recortou a esteira da vela mestra (na tesoura!), de forma que a retranca ficasse mais alta. Ela ficou, mas não foi um corte muito feliz e regular a testa da vela mestra tem sido um martírio: a vela fica toda reguladinha, mas uma bolsa teima em se formar logo abaixo da primeira forra de rizo... Outro martírio tem sido o enrolador de genoa, que teima em emperrar (estou quase voltando para os garrunchos). Por fim, ainda tem a novela do tanque de diesel: ele estava sujo e por isso usávamos um tanque auxiliar (nada mais definitivo nessa vida do que as coisas provisórias). Eu dei uma limpada (sem tirá-lo) e liguei novamente. Duas horas depois, puf! Não funcionava mais. De volta ao tanquinho, lá vai ele novamente: toc toc toc.

E vamos no pano mesmo!



domingo, 3 de fevereiro de 2013

O Capitão Ernesto !

Boas!

Nesse final de semana voltei ao canal de bertioga, para dar aulas. Não, o Velho Mala continua em Ubatuba. Desde novembro eu vinha prometendo aulas para o Marcio e cia. ltda e havia chegado a hora de cumprir. Eles compraram um Gaivota 23, antes chamado Capitão Ernesto e é ele, o Capitão Ernesto (o de carne e osso e que nem habilitado era) o centro desse post.

O cara é uma dessas figuras ímpares. "Funcionário da Dilma" (quando eu o conheci ele se dizia empregado do Lula), recebia sua aposentadoria no dia dois de cada mês e se mandava do interior de São Paulo para o Chinen. Entrava no barco  e... não, ele não saia. Ficava dormindo dias e dias. Em média dez em cada mês.   Não tinha TV, nem rádio, nem um livrinho que fosse para ler. Tudo bem, talvez eu esteja exagerando um pouco: vez ou outra ele acordava, fazia feijão na garrafa (eu não domino a técnica nem o suficiente para descrever) e nadava do barco para a marina  agarrado em um bóia circular (e vice-versa), Quando fazia muito frio lá estava ele em um botinho emprestado. Mas todos os meses o Ernesto passava seus dez dias a bordo. E só comia isso: feijão cozido na garrafa.



Velejar? "-Ah, primeiro eu tenho que comprar um GPS!", desconversava emendando em uma piada (sem graça, na maioria das vezes, mas que tinha um certo colorido por conta do seu jeitão boa praça, de sotaque interiorano carregado).

Um belo dia, depois de tantos anos, ele resolveu tomar coragem. Colocou o motor de popa no suporte (coisa fina, Mercury 8HP rabeta longa com partida elétrica!)  e saiu em direção ao mar. Vela? Não, ele ainda não tinha o GPS. Seguiu pelo canal, passou a barra e guinou para a esquerda, rumo ao Indaiá. "- Nossa, como esse lugar é bonito!", pensava enquanto margeava a praia, olhando para as crianças brincando na areia e para as construções da orla. Estava tão perto que podia sentir o cheiro da carne assando em um fogão no terceiro andar de um prédio nas redondezas! O barco balançava um pouco, meio de lado, mas ele não se importava. Só queria ver aquele litoral tão belo, que antes estava tão perto  mas ao mesmo tempo, tão distante. O barco balançava e a praia ficava cada vez mais perto... mais perto... mais perto... e as ondas ficavam maiores... maiores... maiores... a espuma branquinha era tao linda! Foi então que  que em frente ao SESC Bertioga uma ondinha de dois metros mais maldosa capotou o Capitão Ernesto - veleiro e capitão - que arrastado pela vaga encalhou, meio de lado, na praia.

Pois é.

O veleiro foi resgatado (a muito custo) e não houve nenhum dano, nem físico, nem material.

No mês seguinte, porém, o Ernesto não veio. Nem no seguinte. No terceiro ele veio, mas já para mostrar o barco para possíveis interessados. Um dia, então, o barco passou a ser do Márcio e ontem, depois de tantos anos,  velejou (de verdade) pelo canal, a todo pano. Barquinho legal, hoje batizado de Nathália, até me agradeceu por ter recuperado sua identidade quando subi no caíque para ir embora. "- De nada, meu amiguinho! Velejar é preciso!". Já o Ernesto não é mais Capitão: comprou um Gurgel Carajás, uma barraca de camping e hoje em dia faz seu feijão na garrafa em algum lugar do vale do ribeira!

E vamos no pano mesmo!