quarta-feira, 10 de maio de 2017

De Santos à Ubatuba...

Boas!

Eram cinco da manhã de 28/04. Estávamos a bordo do Jazz 4, em três tripulantes, indo participar do Ubatuba Sailing Festival 2017, que começaria naquele mesmo dia, à noite. Saímos sob aviso de ressaca, que iria de Santos até cabo Frio, com ondas de três metros e duração de dois dias. Ao deixarmos o clube conseguíamos ver bem claramente as luzes da cidade e  das boias de sinalização do canal do porto: ora as verdes, ora as encarnadas. "A ressaca ainda não chegou por aqui", pensei.

Na altura da Ilha das Palmas, no motor, duas lanchas de grande porte passaram a nosso boreste, em alta velocidade. "O mar está baixo", pensei. Ledo engano. Poucos minutos depois percebi que elas pararam na entrada da baía, lá pela Ponta Grossa. Glup!

Não demorou muito. A linha de navios e suas luzes amarelas logo sumiu no horizonte. Poucos segundos depois ela veio. Descomunal. De proa. Não parava de crescer e lá no topo trazia uma espuma branca ameaçadora. Em pouco tempo o valente Jazz  4 subiu a onda e após ter dado uma leve ré,  despencou do alto dos três metros da massa de água. Ufa? Nada. Ainda tivemos mais três dessas.

Pensei em voltar, é claro. Mas a ideia de surfar aquelas ondas não era lá muito convidativa. Sabia que após a saída da baía elas nos pegariam de alheta e até ajudariam a seguir adiante. O problema era passar da Ilha da Moela. Mestra no primeiro rizo, por cautela. Genoa III .Vento de SW, 15 nós. 


O mar seguiu muito desencontrado até depois da Moela, pois a onda que vinha do mar batia no costão rochoso e voltava. Não demorou muito e perdi um dos tripulantes para o enjoo.  Seria uma viagem longa, ainda mais sem piloto?

Teria tudo para ser, mas a forte corrente cuidou para que não fosse. Fizemos de Santos até Ilhabela em apenas seis horas, no pano mesmo. O normal seria entre oito e dez. O Jazz surfava a dez nós. Era surreal e delicioso. Além disso o enjoado ficava bem apenas quando estava no leme... sorte minha e dele.

Na altura do Montão de Trigo tivemos o único incidente sério da viagem: deitei para descansar um pouco e senti o colchonete quente. Coloquei a mão no casco e ele estava em brasa. Levantei o colchão e ao abrir o paineiro encontrei uma das baterias fervendo, cuspindo vapor como uma panela de pressão. Lá em casa, nessa mesma hora, a Alice acordava de um pesadelo, dizendo: "Sinto que uma coisa muito ruim vai acontecer". Coincidência?


Desliguei a chave Perko dessa bateria e desconectei os cabos, com algum custo, pois estava muito quente - os fios também. Avisei para a tripulação o que estava acontecendo, e ouvi duas sugestões no mínimo curiosas: "- Então vem aqui para fora" e "- Vá dormir um pouco!". Pérolas devidamente registradas no diário de bordo.

Por certo ignorei conselhos técnicos tão relevantes e monitorei a bateria de perto. O vapor logo deixou de ser expelido. Assim que deu a coloquei, com algum tanto de esforço e outro tanto de receio, para fora da cabine e depois de uma hora ela finalmente esfriou. Por sorte éramos regateiros atípicos, pois ao invés de aliviarmos o barco, tratamos de enchê-lo com mais pesos, incluindo uma bateria extra. Graças a isso não perdemos a geladeira e os eletrônicos. As regatas eram apenas uma desculpa para ir até Ubatuba.


Após a Ilhabela o vento e as ondas foram embora. Chegamos no motor, após onze horas de travessia. Meu recorde absoluto para essas oitenta e duas milhas náuticas. Todos bem. Amarramos o jazz na poita do Malagô e mais uma vez eu estava em meu metro cúbico no oceano Atlântico, meu pedacinho de paraíso.


E vamos no pano mesmo!

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