sexta-feira, 25 de novembro de 2016

"Os Pirata"!

Boas!


Nosso amigo Marcelo Damini, do veleiro Fratelli (Delta 36), deixou Vitória um pouco antes do nascer do sol da terça-feira,  22/11/2016, com destino a Santos - sem escalas. Essa foi a última perna da campanha do Fratelli para a Refeno 2016, campanha iniciada em julho desse ano.

Ontem a tarde eu e o Eduardo Colombo combinamos de pegar nossos barcos e irmos encontra-lo na sexta de manhã, lá pelos lados da Ilha da Moela, e dar-lhe nossas boas vindas. Como sempre, porém, o Marcelo se adiantou e andou mais rápido do que imaginávamos. Às 19h do dia 24/11 sua previsão de chegada (ETA) era 01h30 do dia 25/11. Então, à meia noite eu fui para a Marina Boreal e junto com o Eduardo saímos para navegar em uma madrugada de tempo bom e vento leste de 20 nós.

Na altura da Ponta Grossa o Fratelli apareceu na tela do AIS e começamos a preparara interceptação festiva, com muitas luzes e buzinas.

Fato é, porém, que quando nos aproximávamos do Fratelli, o Marcelo curiosamente mudou de rumo e começou a tocar no sentido de Praia Grande. Será que ele não sabia onde estava mais o clube, depois de cinco meses fora?  O Erva Doce tentava se aproximar a todo custo, mas o Fratelli fazia manobras muito estranhas, quase evazivas. Quanta grosseria com o comitê de recepção! Nós buzinávamos, mandávamos sinais de lanterna.... mas tudo o que o Fratelli fazia era guinar para lá, e para cá, de um jeito incompreensível.

Chamamos no rádio, canal 68, e nada. Depois de ficarmos um pouco frustrados com aquele jogo de gato e rato, resolvemos chamar no canal16 do VHF.

- Fratelli,copia Erva Doce?
- Erva Doce? É você Eduardo????? - respondeu o Fratelli - Canal Uno Sétimo!

 Lá no canal 17:

- Fratelli , copia Erva Doce?
- Edu???? Por acaso é você que está me seguindo?

Houve um breve silêncio e, depois, o Marcelo continuou:

- Puuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuutttttttttttttaaaaaaaa que o pariuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuu! Eu estou cansado, querendo chegar depois de quase noventa horas no mar e vocês me dão um susto desses?! Eu achei que fossem piratas!

O Erva Doce, então, explodiu em gargalhadas. Ninguém avisou que estaria lá. No breu da noite, o Marcelo só viu um par de luzes indo para cima dele, de forma insistente e com buzinas malucas!

Pois é. Uma hora depois estávamos todos no cais do CIR, rindo do amigo que foi e voltou de Fernando de Noronha, sem nenhuma avaria. Parabéns, Marcelo. Você é o cara!

E vamos no pano mesmo!



quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Travessia Ubatuba e Guarujá - Veleiro Gaudério

Boas!

A seguir transcrevo o relato da travessia feita no último final de semana pelo veleiro gaudério, do meu amigo Laurence Colvara. O texto é de seu único tripulante, Tenório Oliveira, que já foi nosso aluno e tem como personagem de fundo o Montão de Trigo - mais uma vez ele.

Quem tiver um texto com relato de travessias pode me enviar que o blog tem espaço para isso também!

E vamos no pano mesmo!

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A Zanga das Ondas, por Tenório Oliveira

Na entrada do canal de São Sebastião, tendo a formidável Ilhabela a bombordo, a água do mar esmeralda sem vento e ondas, parecia uma piscina espelhada refletindo o verde da mata Atlântica. Singrávamos na direção sul.
Saíramos bem cedo do Saco da Ribeira. Chovia forte pela madrugada e eu ainda com sono, levantei-me, vesti roupa para chuva, soltei as amarras da poita e partimos para Santos.
O Gauderio navegava lépido com velas enfunadas ao vento de sudeste, que calculávamos uns 12 nós. Eu o levava ao leme enquanto Laurence, nosso intrépido capitão e comandante da nau tomava seu café da manhã tranquilo como um monge. Na paisagem eu avistava os mastros dos veleiros da sucursal do elegante Iate Clube de Santos, o Iate Clube de Ilha Bela, a igreja da Vila, e no canal, os barcos de pescadores e balsas atravessavam açodados e apinhados de turistas para o final de semana na ilha.
Ao Sul e sudoeste reparávamos as nuvens carregadas. Claudio, do veleiro Nova Era já havia nos avisados que estava em Guarujá com sua tripulação acompanhado da flotilha caiçara, que um vento sudoeste estava por chegar e já chovia muito em nosso destino. Os planos de encontrarmos com a flotilha em Indaiá estavam cancelados. Sua tripulação num misto de inquietude e frustração permanecia em terra aguardado melhor oportunidade. Arthur, seu guri de 7 anos teria que esperar para comer o salmão assado que eu havia separado pra ele.
Laurence e eu, sabendo que não haveria escala em Indaiá e que apesar das nuvens roxas, a previsão da marinha e dos sites de meteorologia indicavam vento fresco e ondas de dois metros e meio o que não significaria transtornos à frente. Como se diz na terra do comandante, seguíamos faceiros como guris de bombachas novas.
Dizem que Deus protege os singelos, os parvos, e os ébrios. Não havíamos bebido. Saindo do canal o mar começava a ficar mais crespo, uma gaivota nos sobrevoava e nossa maior preocupação era manter uma câmera preparada para filmá-la.
As vagas começavam a crescer na rota sudoeste entre o canal de Ilhabela e a ilha da Moela no Guarujá. A visibilidade já havia diminuído bastante, não mais podíamos ver a costa e o horizonte não passava de água, nuvens e fina chuva. Eu perguntava ao Capitão qual seria altura das ondas enquanto fazia meus próprios julgamentos. Recolhi a genoa e no balanço forte das ondas coloquei um colete e fui à proa soltar o cabo do enrolador que estava entranhado no estai. No nosso caminho veríamos a famosa Ilha do Montão de Trigo, companheira de horas dos navegadores daquela rota. Porém com o tempo fechado e neblina no horizonte, não havia sinal do Montão. As ondas continuavam a crescer e batiam cada vez mais forte no costado do barco. A chuva apertava, o Gaudério começava a surfar e deslizar pelas cristas das ondas e o balanço do barco fazia com que todos os objetos na cabine fossem arremessados de um lado para o outro. O chuá e a baba das ondas cada vez se faziam mais intensos.
O experiente Laurence ao leme vencia as ondas com precisão. O vento rondava de alheta para popa fazia com que o barco virasse em roda, como dizem os portugueses. Laurence por vezes clamava para que eu amparasse a escota da mestra evitando assim os vigorosos solavancos da retranca contra o traveller. Jaibe louco! Éolo, Netuno e Zeus brincavam com aqueles bravos marinheiros.
Estávamos encharcados e eu começara a duvidar da nossa direção, pois Laurence havia comentado na manhã que o plotter e GPS não estavam sincronizados, mas não me dissera que ele próprio já havia corrigido o problema. De qualquer forma pediu para que eu entrasse na cabine e verificasse no plotter a posição e distância do Montão de Trigo, pois iríamos nos refugiar lá. Plotei a distância de 7.9 milhas à amura de boreste, tendo As Ilhas próximo ao través. Eu começava a ficar ansioso, pois não tinha ideia até quanto aquelas ondas cresceriam. Comecei a me sentir como uma velha numa canoa. Por vezes entrava na cabine e checava a direção do Montão. Laurence me perguntava se eu tinha certeza da direção e distância do mesmo, pois não avistávamos-o e ele não conseguia ver em seu GPS, pois o mesmo estava com o mostrador molhado e seus óculos estavam cheio de gotas. As ondas se levantavam a cinco e seis metros fazendo sombra no costado barco. Restávamos continuar navegando e acreditando no plotter, já que as alternativas eram a ilha de Alcatrazes que estava muito longe em alto mar, ou “As Ilhas”que seria uma mudança de direção um tanto frustante.
Em velocidade de 7 nós tracionados pela potente vela mestra e motor, contando com a precisão dos equipamentos de navegação e, a destreza do capitão estaríamos em uma hora na ilha do Montão de Trigo. Enquanto navegava eu me lembrava do Renato regateiro, meu sócio no Safa-Onça que havia me dito que um veleiro é metade submarino e metade barco. Também sabia que a quilha manteria o barco sempre em posição vertical, mesmo que a força de uma onda entornasse o mastro à água, o peso da quilha o puxaria de volta para sua posição original. Nem mesmo se a vela mestra se enchesse d’água o peso da quilha traria tudo de volta dando estabilidade à nave. Este equilíbrio de força entre quilha, mastro com velame é um entre outros tantos fascinantes inventos da engenhosidade humana. De qualquer forma, adernar a tal ponto naquelas condições de vento e mar não era ainda o caso pois não estávamos no meio de um ciclone, um furacão ao sul do equador seria algo extraordinário, e eu acreditava no valente Gaudério. Imaginava a quantidade de energia dispendida naquela luta das ondas e no volume de água sendo remexido naquela sanha marítima. Estávamos preparados para o mar crescente e as chances de que tudo terminasse bem eram de 99%, sendo que o restante 1% só ocorreria se topássemos com um improvável iceberg, uma jubarte, ou um cachalote de Herman Melville.
Avistamos o Montão de Trigo quando estávamos a uma milha de suas escarpas. Nesta hora aprendi de coração o significado da frase “terra a vista!.” De longe avistamos vários pesqueiros e Laurence me disse que quando os pescadores se escondem é porque o mar não está para peixe. Entrando em águas mais calmas o barco volta à sua docilidade. Ancoramos entre as traineiras de pescadores e distante 200 jardas do solitário veleiro Matajusi que mora apoitado ali. Apesar das águas abrigadas, ventava muito forte e as ondas balançavam o Gaudério agora preso ao ferro.
Entramos para cabine e, acho que devido ao balanço das ondas e ter ficado muito tempo na cabine apressando o plotter e cheirando óleo diesel, fiquei meio mareado. Corri para fora do barco e dei uma golfadas à sotavento. Logo estava curado. Jantamos arroz integral, Laurence escolheu carne assada e eu uma posta de salmão. Como sempre, nutri-me com uma banana como sobremesa. Laurence saboreou parte do seu estoque de “nego bom,” um doce Recifense. O vento forte batia as adriças de encontro com o mastro e o veleiro balançava sem trégua. Laurence, por vezes saia para a proa a fim de verificar o fundeio. A âncora continuava firme. Meus nós simples e eficientes feitos no cabo da âncora aos cunhos de proa se mantinham firmes e intactos. Como uma vez me disse o tio Spinelli, se você faz muitos nós sobrepostos e com muitas voltas, demonstra insegurança, se você amarra nós soltos, mal feitos e frouxos, demonstra imperícia ou mesmo o pior, a negligência. Portanto equilíbrio entre negligência e insegurança são fundamentais. Como Laurence não mexeu em nada, me dei por satisfeito. A despeito da âncora estar unhada ou não, eu tinha certeza que aquele vento não soltaria a amarra, e também sabia que soltá-la seria uma tarefa trivial na hora da partida.
À noite, depois de inspecionar a embarcação, Laurence entrou no barco me dizendo que o cabo da âncora se via fluorescente, um interessante fenômeno. Pensei que o capitão estivesse alucinando já que não havia tomado seu chima matinal naquele dia pois havia esquecido da erva mate. Fui depressa curioso ver a luminosidade. Minha teoria era que as luzes da costa da barra do Sahy, o reflexo da lua cheia entre as nuvens, e as borbulhas que saiam do cabo com o jorrar da corrente da maré resultavam naquele efeito de fluorescência. De qualquer forma não concluí nada, já que estava frio, chovendo e havia pouca visibilidade para um exame mais detalhado. Depois aprendi com Felipe Degan Ferraz que a luz é causada por micro-organismos, plâncton que possuem bio-luminescência quando encostam em algo. Fica a dica para nadar na próxima vez que verificar o fenômeno.
Cansado e de panturra abastecida, dormi como um gato de armazém. Laurence dormiu poucas horas, pois sua responsabilidade como comandante não o deixara descansar sossegado e se manteve alerta como um capitão de longo curso.
Na manhã seguinte, logo as seis horas acordamos e tomamos café da manhã. Saímos ao convés, olhamos para o horizonte e víamos as traineiras ainda ancoradas e cerradas. Ao longe Laurence mirava na distância o vai e vem das ondas, e depois de uns minutos de reflexão me disse que as condições não pareciam boas e que aguardaríamos mais um pouco até que nova avaliação fosse feita.
Mantínhamos contato com nossos amigos velejadores do Guarujá. O comandante Juca do Malagô e da Cusco Baldoso nos enviara uma mensagem merecedora de uma moeda de alvíssaras, pois nos avisava que a frente fria estava passando e que o barômetro começava a subir. Depois de umas duas horas voltamos ao convés e em tom grave e resoluto Laurence disse que levantaríamos âncora e partiríamos. Lembrei-me de Pessoa e dos olhos azuis de Ulisses, o Guimarães, não o da Ilíada: navegar é preciso.
Soltamos o ferro, subimos a vela mestra, ligamos o motor e no timão contornei uma das traineiras para aproar em direção à ilha da moela coincidindo com a linha reta mostrada no Garmin do capitão Laurence. O mar estava mais calmo, eram ondas de três metros que logo depois evoluíram para quatro metros e tantos. As condições ainda eram de cautela, mas não se comparavam ao do dia anterior. Era dia 13 de Novembro do ano de 2016 do nosso Senhor. Por volta das 14 horas no horário de Brasilia, 16h GMT, no rádio a marinha avisava em chamada geral “ressaca com ondas de até 4,5 metros.” No site da marinha os avisos de mal tempo anunciavam “AVISO NR 1591/2016 AVISO DE VENTO FORTE. EMITIDO ÀS 1600 HMG - DOM – 13/NOV/2016. ÁREA CHARLIE A LESTE DE 046W A PARTIR DE 150000 HMG. VENTO E/NE FORÇA 7 COM RAJADAS. VÁLIDO ATÉ 161200 HMG. AVISO NR 1592/2016 AVISO DE MAR GROSSO. EMITIDO ÀS 1600 HMG - DOM - 13/NOV/2016. ÁREA CHARLIE A LESTE DE 046W. ONDAS DE E/NE 3.0/4.5 METROS. VÁLIDO ATÉ 161200 HMG.
Por volta das 16 horas avistamos o farol da ilha da Moela e logo em seguida fizemos um jaibe para cruzar o pequeno e agitado estreito que separa a ilha e a ponta da Munduba a boreste, na ilha de Santo Amaro. Seguindo em direção a baia de Santos, por boreste meus pontos de referência eram o forte dos Andradas, a praia do Sangava, do Goes, e finalmente entramos no Canal. Cruzamos com um Panamax carregado de contêineres, uma catraia em direção ao Goes, e ao nosso bombordo nos acompanhava uma barcaça que dera meia volta, pois meia hora antes comentávamos suas infrutíferas tentativas de vencer as ondas com sua proa engolfada nas ondas. Finalmente avistando a grua amarela da Petrobrás na proa e a vila de nossa senhora dos Navegantes à boreste, entrego o leme ao capitão, que com habilidade entra no canal em direção ao pier do CIR enquanto com um croque puxo as espias e as prendo nos cunhos de popa do Gaudério. Estava assim finda nossa travessia de Ubatuba ao Clube Internacional de Regatas de Santos. 
Como diz o Rappa, Navegar é preciso senão, a rotina te cansa.

PS: No dia sábado dia 12, enquanto enfrentamos o ápice da tempestade, um pesqueiro naufraga batendo de encontro com as pedras da ilha da Moela. Houve um sobrevivente e dois corpos foram encontrados no dia 13, o mesmo de nossa chegada.
Que Deus proteja os navegantes e principalmente aqueles que dependem do mar para sobrevivência.

terça-feira, 8 de novembro de 2016

Homenagens

Boas!


Eu nunca fui um cara de muitas firulas. Em verdade muitas vezes me faltam social skills básicos. Mas, de uns tempos para cá, isso tem mudado. Talvez seja a idade. E essa, com certeza,chegou. Semana passada voltei a remar canoa hawaiana, depois de mais de quinze anos. Quando a professora me viu, foi logo perguntando: "- O SENHOR já sabe remar?". Pois é, virei um senhor... virei o pai da Brida, ou o pai da Alice. Trinta e sete anos... e outro dia eu era apenas um menino, que sonhava servir na aeronáutica.

Mas se virei um tiozão, virei também Amigo da Base Área de Santos, por indicação do comandante da BAST, o meu amigo Cel. Panza, em agradecimento aos relevantes serviços prestados por mim àquela organização militar (é o que está escrito no Diploma!).




E menos de uma semana depois, recebi uma homenagem da ABVC Interior, pela contribuição que temos dado ao pessoal da água doce. Como se fosse algum sacrifício ir até lá, comer o churrasco do Paulo Abreu e conversar com gente tão legal!



Eu autografando meu livro para o sempre gentil Mario Buckup (e não o contrário, rs), ao lado ainda do Wadinho Barô e do Pirata da Ilha! Uma honra estar perto de pessoas tão especiais.

A vida é feita de fases. Vamos ajustar as velas e seguir, no pano mesmo...