segunda-feira, 18 de abril de 2016

Com emoção...

Boas!

Nesse final de semana as meninas estavam querendo navegar. E navegar com elas, é sempre uma emoção (no sentido figurado e literal).

No sábado resolvi levá-las até um lugar onde nunca havíamos estado por aqui, a Ilha do Mato, na praia do Guaiuba. Há tempos tenho passado por ali, mais ao largo, e vejo diversas lanchas fundeadas. Claro que isso não é boa referência, mas talvez valesse a pena ir ver como era o lugar.

Quando chegamos já passava de 14h e o ancoradouro estava cheio de lanchas. Fundeamos mais para fora, mas dentro do canal. A profundidade é de nove metros (eu prefiro ancorar  em cinco, pois é menos corrente para puxar no braço depois) e a geografia do lugar (um canal estreito entre uma ilha e o costão rochoso) forma alguma correnteza, mas nada absurdo. Absurdo mesmo só os jets, que passam por ali em velocidade sem se dar conta de que há gente nadando... As meninas mergulharam a tarde inteira, em uma água de 29º C que lembrava nossa amada Paraty.



A emoção desse dia foi meu óculos ter sumido misteriosamente durante o tempo que fui nadar e, no meu procura ali, procura lá, a Alice soltava de vez em quando: "Acho que caiu no mar...". Fui ter uma conversa mais séria sobre isso com ela e perguntei: "Eu posso continuar procurando os óculos ou eles estão mesmo no mar?". Ela, mesmo jurando não saber nada sobre o assunto, foi bastante categórica: "Com certeza está no fundo do mar... bem lá no fundo. Mas não fui eu!". Pois é, voltei para casa em braile.



No dia seguinte fomos repetir a façanha, já que o dia anterior havia sido tão agradável. Eu me esqueci, porém, da lição sagrada: no mar nenhum dia é igual ao outro...

Fomos motorando até a Ilha do Mato, onde chegamos em cerca de uma hora de navegação. Ai o caldo começou a desandar. Parei o barco na ancoragem e me preparei para descer o ferro. Demorei um pouco para safar âncora e nessa o vento girou o barco.  Voltei para colocar o Malagô mais uma vez contra o vento e a Priscila se ofereceu para ir lá na proa fazer o serviço. Como ela já fez isso milhares de vezes, pensei, não haveria problema. Ledo engano...

Ela não baixou o ferro, ela o soltou. A corrente descia sem controle algum. São trinta metros de corrente e vinte de cabo sintetico nesse meu arranjo de fundeio usado para ir só até ali. Vi, alarmado, o cabo sintético começar a desaparecer também. Só tive temo de gritar: segura o cabo!!!
Por sorte a Priscila segurou o cabo a uns dois metros dele acabar. Teríamos ficado sem âncora. Aproveitei a lição e ensinei, uma vez mais, a dona Patroa a baixar a âncora. Casa de ferreiro...

Mas não era só isso que estávamos sem. As meninas foram nadar e eu fui dar uma geral no barco. Percebi, então, que não havia mais do que meio litro de diesel no tanque! Eu uso no dia a dia um tanque pequeno, de vinte e cinco litros. O tanque do barco tem duzenos litros e é muito diesel para mim. Desse jeito há menos condensação no tanque e a manutenção é muito facilitada. Ocorre que de vez em quando tem que encher e a última vez que eu enchi o tanque foi no dia vinte.

Vinte de janeiro!

Ficar sem diesel não era nenhuma emergência, pois havia vento e, afinal, somos um veleiro. Então, para não perder o tal do vento que soprava generoso (e que tende a sumir no final da tarde), subi a vela mestra e nos tirei do fundeadouro no pano mesmo. O pouco de diesel que nos restava eu usaria para nos safar de algum eventual perigo ou para colocar o barco na vaga.



Mas Murphy é um cara implacável. O vento de dez nós de leste que estava soprando antes simplesmente acabou. Teríamos cinco milhas pela frente e nossa velocidade era de apenas um nó, e isso graças a maré e a uma brisinha que entrava de quando em vez. No geral era mar espelhado. Avisei as meninas que seriam cinco longas horas até a marina. Houve alguns protestos, mas no geral elas foram bem legais (exceto por essa mania de dormirem abraçadas nas catracas!). 

O plano era levar o barco até pelo menos a entrada da barra e de lá pedir auxílio para a catraia do clube. Não pela ausência de vento, nem de diesel, mas pelo estado mental das meninas. Quem tem três mulheres em casa sabe que elas podem lhe deixar maluco em questão de segundos!

Na saída do Guaiuba havia uma lancha, a Hora do Ronco, fundeada em um lugar pouco usual. Havia um cheiro de churrasco e bordo e pessoas nadando em volta. Ao chegar mais perto alguém gritou: "- Vocês têm um alicate?! Meu motor [à gasolina, claro] quebrou!". Desviamos nosso curso (eles estavam à barla, e nós íamos para sota) e fomos até a lancha emprestar o alicate. É a lei do mar! Sem saber aquele sujeito me fez um grande favor: quando as meninas pensavam em reclamar da demora, eu as lembrava que aquele cara e sua tripulação nem tinham saído do lugar.

Depois de três horas estávamos no través da Ilha das Palmas. Navegamos apenas três míseras milhas, mas estava tudo dentro do previsto e andar a um nó constante é melhor do que não andar a nó nenhum, ou andar para trás. As meninas dormiram e isso me deu certo alento. A chateação é que na entrada da barra as poucas rajadinhas de dois nós vinham de popa e a mestra e a genoa não armavam de jeito nenhum. O alicate a essa altura jamais seria devolvido. Ai veio a complicação:a Brida acordou com frio. Febre! Precisávamos fazer alguma coisa... Mas o quê?



Foi então que do nada  uma lancha parou do nosso lado. A bordo, nosso amigo e instrutor em nossa escola de vela Alan Trimboli: "-Alan, você tem diesel ai?" - gritei. E ele respondeu: "- Reboque?! Pega o cabo!". Bem, não era bem o que eu queria, mas servia também!

A Enseada  nos rebocou até a entrada da marina do CIR. Lá eu liguei o motor e soltei o cabo, certo de que teria diesel suficiente para entrar na vaga. Mas Murphy estava com tudo... Disse para a Pri: "- Pronto, chegamos em ca...". 

Nesse instante a proa do Malagô subiu um metro: encalhamos na entrada do clube! Que mancada essa minha, pois aquele banco de areia é manjadíssimo (e não foi a primeira vez que encalheu nele. Nem a segunda. Ok, nem a terceira!). Nisso uma outra lancha veio nos socorrer e... encalhou também! Por sorte a maré estava subindo e quando uma lancha grande passou, liguei o motor e aproveitei a marola para desencalhar. Deu certo! A outra lancha foi desencalhada pela barquinha do clube.

"- Agora vamos para casa", disse. Mas... ao entrar na vaga a maré ainda não estava alta o suficiente e... encalhamos de novo! Por sorte já estávamos no clube e o pessoal da catraia nos ajudou a resolver a situação. 

No fim ficaram as gozações e as lições. O mar é assim, sempre nos mostra que a gente não sabe de nada, principalmente quando acha que já está entendendo alguma coisa. A febre da Brida passou e ficamos todos bem, com mais uma história para contar e muita tiração de sarro para aturar!

E vamos no pano mesmo!

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