domingo, 8 de setembro de 2013

Amar o mar.

Boas!

Eu nunca, nunca, mas nunca mesmo, vou ao mar sem sentir medo. Talvez por isso viva me preparando para o pior - e para um pior que até agora não veio. Ironias a parte, meu maior ventão foi na Guarapiranga, em uma empopada louca que me deixou tremendo por alguns minutos (já em terra), em um misto de pavor e prazer - não necessariamente nessa ordem. 

Tenho medo e acho que é por isso que estou vivo. Velejei sem motor dez anos. Só na vela, em barcos minúsculos, entre navios. Perdi lemes, mastros  e velas explodiram (atentem para o plural).  Hoje, muitos anos depois de me tornar velejador, continuo sentindo medo e ficando sempre alerta, como um escoteiro bundão.

Há algum tempo (principalmente depois da retrancada, que está para completar um ano) eu até me questionei se queria mesmo continuar com isso. Afinal, eu nunca relaxava, a não ser quando já estava lá no mar. Para que tanta angústia prévia? Tanto sofrimento estudando previsões e imaginando o que de errado poderia acontecer? Para que me expor ao risco de cair no mar ou de ter outro touro entrando pela minha testa? Para que dar aulas, ficando longe de casa, se não há a menor necessidade disso?

Mas é só dar uma velejada decente - leia-se: com vento e sem motor! -   e todas essas dúvidas passam, se dissipam. Basta ver algo que apenas se vê do mar, que as incertezas vão embora. Basta estar na ilha da cotia - ou até mesmo na poita, como hoje a tarde -, com minhas três meninas, para perceber que não conseguiria viver outra vida. É só ver o brilho nos olhos de alguém que um dia antes nunca esteve lá, e durante algumas horas de aula já está no comando de um veleiro que a vontade de continuar renasce, vívida. O maior perigo está no sofá e no controle remoto. Na rotina. Na não escolha.

Fico sem carro numa boa; mas sem barco, me sinto nu. Um veleiro é um problema cuja solução está nele mesmo. É uma máquina de tempo: e tempo é o que há de mais caro nessa vida apressada de hoje em dia.

Eu decidi me fazer ao mar. Não para viver aventuras. Mas apenas para estar lá, ir " só até ali" e depois voltar correndo para a Priscila, para a Brida e para a Alice. Não quero ser herói nem lutar contra os elementos. Os hérois, os de verdade, estão mortos; os de mentira (como os do BBB), são fraudes. E nesse caminho, espero poder ensinar meus alunos não apenas a velejar, mas a amar o mar, com toda a sua fúria serena. O mar nos chama.

E vamos no pano mesmo!



10 comentários:

  1. Rapaz, só um dia perfeito a bordo e com o convés cheio de 'mulheres', é que pode dar tamanha inspiração!! A vela e suas incertezas são o sal da vida!!

    abraço amigo!!

    ResponderEliminar
  2. E bota inspiraçao nisso! Parabens Juca! Pura essencia! Abraços.

    ResponderEliminar
  3. Sabedoria Juca, sabedoria!
    É isto que ganhamos com o tempo, com o mar e com o amor.
    E vc meu amigo, já é um jovem "velho lobo do mar".

    Abraços

    ResponderEliminar
  4. Comandante belíssimo texto, assino embaixo. O medo nos mantem vivos, somente quem tem medo passa pelas dificuldades com sabedoria, pois conhece seus limites e força dos seus adversários e sabe analisar o risco e melhor que isso não precisa provar nada a ninguém. O importante é estar preparado para passar pelas dificuldades com sabedoria.

    ResponderEliminar
  5. Juca,

    Adorei o texto, parece que todas as aflições dos velejadores são as mesmas. "Um veleiro é um problema cuja solução está nele mesmo", perfeito!

    Abraços,

    Matheus

    ResponderEliminar
  6. Boas, Galera! Obrigado pelas palavras de todos!!! Esse texto na verdade surgiu em uma resposta a um e-mail da Thelma Spangenberg, onde falamos sobre o receio de se fazer ao mar. Agradeço a ela a inspiração!!!

    ResponderEliminar
  7. EXCELENTE TEXTO, SIMPLESMENTE PERFEITO, BELÍSSIMAS PALAVRAS
    PARABÉNS JUCA ANDRADE. FICOU TÃO PERFEITO QUE NÃO MODIFIQUEI NADA E POSTEI NO MEU BLOG COM TODAS AS HONRARIAS E HOMENAGENS CABIDAS, BEM COMO LINK, DESTAQUE CLARO DO AUTOR. NO INTUITO DE DIVULGAR SUA POESIA E PROSA BELÍSSIMOS. DIGNOS DE UM LIVRO. PARABÉNS MESMO. LEONARDO DA VINCI DIZIA QUE A SIMPLICIDADE É O MAIS ALTO GRAU DE SOFISTICAÇÃO DO SER HUMANO. ACHO QUE SEU BLOG (SOU FÃ), SEUS TEXTOS, SEU BARCO, E PRINCIPALMENTE ESTE SEU TEXTO SÃO ASSIM. UM TEXTO SEM FILOURAS, SEM REBUSCAMENTO, UM TEXTO FLUIDO, SINCERO, VERDADEIRO, RÁPIDO, SIMPLES, MAS EXTREMAMENTE LINDO E PERFEITO, AUTÊNTICO. MEUS PARABÉNS. ATT, ALEX BRITO (CATAMARAN SAMEJ)

    ResponderEliminar