quarta-feira, 20 de novembro de 2013

O mais longo dos dias - parte IV

"- Imagina se o Júlio França estivesse aqui?" -  provocou o Cassio.  Eu ri. Na travessia para Ilhabela eu praticamente o embarquei a força, pois ele estava receoso. Tudo tem seu tempo. Se pegamos aquela  porranca é porque era a hora. Pior seria se eu estivesse com a Pri e as meninas, o plano original...

Amanheceu e voltei para o convés. Estavamos um  pouquinho mais perto da  costeira,  mas ainda seguros. O mar trazia ondas de três metros, algumas maiores. O barco capeava magnificamente bem. Tentei abrir a vela, mas o enrolador travou. Os restos do lazy jack se projetavam como lanças para fora do barco e se enroscaram nas escotas.Fui até a proa, deitado no convés. Livrei parte do enrosco, mas não foi suficiente.O Ivan, atado ao cinto, surgiu meio que do nada e me ajudou. Voltamos para o poço e abrimos a genoa. Meu plano era voltar para casa de través. 

Mas não seria tão simples. Ao abrir a genoa a capa foi para o espaço. O barco andava em círculos, procurando sempre ir para a praia! Mais grave, a velocidade subiu de meio patra quatro nós. Em menos de duas horas estariamos na praia  e tudo estaria perdido. Não consegui aceitar essa ideia. Liguei o motor. Quarenta graus. Mantive a rotação baixa, para retaradar o aquecimento. Retomei algum controle de leme, mas o barco não orçava de jeito nenhum. Sessenta graus. Andava em círculos, mas o rumo final ainda era a costeira.  

"- Vou tentar entrar no Indaiá" - disse para o Ivan. Mas, claro, essa ideia logo passou, pois era impossível: a medida que chegassemos perto da praia, as ondas só iriam piorar. O mais seguro era ir para longe. Setenta graus. Pus a proa no rumo sul magnético e toquei. O motor então chegou a oitenta graus. O Ivan voltou para dentro da cabine. 

Foi então que tomei uma decisão difícil. Não na execução, mas em sua popularidade: voltar para o Montão de Trigo.  Isso seria algo como dirigir a noite toda entre São Paulo e Florianópolis e, depois de Joinville, resolver voltar para encher o tanque do carro em Santos. Coloquei a proa no Montão - que sequer podia ser visto, em meio a névoa -  e o barco foi surfando as ondas. O motor ficou a oitenta graus.

O frio me matava e uma das poucas - senão a única - alegria que tiv nesse dia foi fazer xixi na calça. Esquentou meus pés e foi muito gostoso.O mar nos dá outras perspectivas na vida...

Algumas horas depois o Cassio veio me render no leme. Expliquei nosso rumo. O barco seguia a dois nós, mas avançava e o motor não esquentou mais além dos oitenta graus. No mau tempo uim porto a sotavento, por mais longe que esteja, será sempre mais fácil de se chegar do que um a barlavento...

Ainda não estava tudo resolvido. A impopularidade da minha decisão precisava ser contornada.Chamei Delta 24 o radio e expliquei a situação.Pedi um acompanhamento de hora em hora para reportar a situação e a posição. A operadora foi super gentil e prestativa. Anotou os dados do barco, de nossa marina e da Priscila, para o caso de...  A tripulação se trranquilizou ao saber que não estavam tão sozinhos quanto pensavam. Ou pelo menos se confortaram com essa ilusão...

Conseguimos avistar o Montão de Trigo apenas a menos de uma milha e meia de distância. Ao nosso redor apenas névoa branca, ondas altas e um vento mais ameno. Ao  meio dia lançamos ferro. Estavamos em um abrigo!

Bem, comparado a condições normais abrigo é um baita de um eufemismo. Balançava bastante. Mas era melhor do que "lá fora".

Assim que nos estabilizamos começamos a por ordem na casa. Fui tomado por uma onda de frio e deitei um pouco, enquanto os meninos arrumavam as coisas espalhadas por todos os lados. Tudo estava encharcado. Para vestir me sobrou apenas um short john e uma camiseta com o emblema do Super Man que ganhei na escola da Alice no dia dos pais. Ela tem uma igual, mas adequada para o tamanho dela.

Fizemos contato via VHF com o Iate Clube de Barra do Una e conseguimos um transporte com um pescador do Montão de Trigo, para desembarcar o Rodrigo e o Ivan. Eles teriam que estar em São Paulo na segunda de qualquer maneira. O André e o Cassio também tinham, mas foram sensacionais e ficaram comigo. Obrigado! Depois do almoço eles foram para terra. Valeu galera!

Entrei em contato com minha casa via celular e algumas vezes com o Alan Trimboli. Decidi que só sairia dali com tempo bom, mesmo que ele demorasse a chegar. A previsão para a segunda-feira, porém, não poderia ser melhor: ventos de leste e sueste, até oito nós.

Consertei a mestra no fim da tarde. Estavamos sem talas, mas dos males o menor.Voltamos a ser um veleiro! Encontramos alguns objetos estranhos no compartimento do motor: pratos, talheres e uma câmera filmadora, mas há controvérsias sobre o momento em que esses objetos foram parar ali.

Dormimos o dia todo. O jantar foi feito pelo Cassio, que arrumou um problemão: já não sei quem é o melhor cozinheiro, se ele ou o Ivan!

A noite o tempo abriu e a lua cheia deu um espetáculo, em harmonia com a silhueta do Montão. Por vezes eu ficava impaciente, mas ai olhava para o emblema do Super Man na camiseta e melembrava da Alice e das meninas. Não podia fraquejar. Não iria!

No dia seguinte, às 06h00 acordei e perguntei para meus tripulantes: "- Quem quer ir para casa?"

Às 06h30 já estavamos velejando.  O motor foi ligado para ajudar,já que o vento era ainda fraco e voltou ao normal, trabalhando abaixo de sessenta graus. Vai entender... No través de Bertioga chamei o Iate Clube de Ilhabela para agradecer o apoio: "- Estamos em condições plenas de navegação!". Liguei para casa e depois de saber das novidades a Priscila caiu no choro...

Secando...

... lavando...


Voltando para casa.

No meio da tarde atracamos na Boreal. Para minha surpresa e pela mais absoluta coincidência, se é que isso existe mesmo, minha pequenininha Alice estava vestindo a camiseta dela de Super Man! Ai quem caiu no choro fui eu, mas deu para disfarçar...


Era o fim.

Chegamos.

 Palavras não são suficientes para agradecer as várias pessoas que nos ajudaram. Em primeiro lugar eu devo agradecer a minha valente tripulação, que mesmo possuindo instrumental limitado soube se comportar de maneira exemplar, mantendo o moral a bordo o melhor possível. Então, obrigado ao Cassio, ao Ivan, Ao André e ao Rodrigo. O que nós vivemos só nós sabemos e levaremos isso para  resto de nossas vidas. Várias foram as lições.

Milhões de obrigados, ainda, ao Alan Trimboli, que monitorou nossa situação o tempo todo, em conjunto com o Volnys Bernal.

Quatrocentos milhões de obirgados ao meu irmãozão Ricardo Stark, que conseguiu  tranquilizar a Priscila. Eu imagino o trabalho que isso deu! E a ela, Priscila, meu amor, bilhões de obrigados por saber me esperar...

Obrigado, claro, ao nosso velhinho, o Malagô,que foi protagonista nessa história - até porque tem momentos que ele só faz aquilo que quer!

E obrigado a todos que pensaram na gente positivamente.

Bons ventos e estrelas à barla, sempre!




O mais longo dos dias - parte III

O vento entrou, mas não veio tão forte quanto eu esperava. Coisa de vinte nós e, vinte nós, devidamente rizados, não matam ninguém. Vento de través, vindo de sul. Mar crescendo, mas nada absurdo. Ainda sem motor, nem reclamavamos mais pois íamos entre seis e sete e poucos nós direto para casa. Motor de veleiro é vela!

Acertadamente  coloquei nosso rumo não para as proximidades do Indaiá, mas sim para a Moela. Uma aproximação no Indaia seria feita com ele bastante ao largo, pois havia o risco de estando perto demais, fossemos conhecer sua costeira. Isso salvou o  barco e, talvez, nossas vidas.

O Malagô pôs suas artroses para trabalhar. Zumbia, rangia, gritava...a madeira viva que lhe habita produzia os sons mais inusitados. Improvisei um "preventer" na retranca, deixei o Cassio e o Rodrigo no convés e  voltei para dentro, para tentar dormir. 

Quando o vento de vinte nós começou estavamos no través de boracéia. As 03h00 da manhã, no exato través do Indaiá, aconteceu: o vento entrou de verdade. Mas de verdade mesmo. Eu estimo em mais de quarenta nós.O mar ficou branco. As ondas quebravam no convés. Um uivo estridente não saia do ar e falar uns com os outros era praticamente impóssível. A velocidade do barco foi para as alturas e os choques com as ondas extremamente violentos.

"-Muito pano em cima, o mastro não vai aguentar" - pensei.  Com a ajuda do Ivan vesti o cinto de segurança.Ele também vestiu um. O Rodrigo voltou para dentro da cabine e ficou com o André, que recém atingido por uma prateleira voadora trazia um galo feio na testa.  Muitas goteiras de água salgada. Medo. Atado à linha de vida, fui até o mastro. Pedi para o Cassio jogar a proa um pouco mais para o vento. A vela desinflou e comecei a descê-la. 

Ali, agarrado ao mastro, algo surral aconteceu: ao invés de pavor,  ou pânico, eu só conseguia olhar para a água branca e sentir uma paz indescritível. "- Como isso é bonito", eu me pegava pensando "-Que coisa mais linda!". Devem ter sido cinco ou dez segundos, mas duraram minutos em minha mente. Paz e beleza. Era tudo o que eu sentia. Juro que nunca havia visto algo tão lindo no mar... Devaneios?

Voltei a mim ao pensar nas meninas. Também retomei a objetividade ao constatar que se alguém caísse no mar naquelas condições dificilmente contaria a história depois. A mestra desceu bem, mas o lazy jack voou pelos ares. Com isso ela caiu dentro da água e formou uma barriga. "-Explode, vela!" - gritei.  Tentei embarcá-la novamente, mas sozinho seria impossível. O barco subia e descia as ondas - o mar cresceu bastante. Com muito dificuldade, pois era dificil caminhar sem que o vento me derrubasse, fui até a popa e cortei com uma faca  o cabo do rizo. Não ajudou em nada a não ser tornar as coisas piores: a barriga submersa da vela aumentou e o pino que segurava a valuma na retranca estourou. Minha vela mestra é alemã, tem mais de quarenta anos e aguentou esse esforço ilesa: quem gritou foi o pino. "- Mania que alemão tem de só fazer coisa boa!" - pensei.

Com a vela fora da retranca foi mais fácil embarcá-la novamente, com a ajuda do Ivan. Veio a chuva, com violência extrema. Dei um jeito de estivar a vela por cima do convés - do jeito que deu e não foi bonito - e pedi para o Ivan voltar para o convés.

Sem a vela mestra o controle do leme foi para o espaço. Estavamos a oito milhas do canto do Indaíá, em Bertioga. Por sorte bem afastados de terra e em um local onde passam poucos navios. O problema eram os pesqueiros, mas o que fazer?! Mantive todas as luzes de navegação acessas. Olhei para o Cassio e percebi que o leme estava travado para bombordo. Um pedacinho de genoa estava armado para boreste. O barco "travou" alinhado a quarenta e cinco  graus com as ondas. Não ia para a frente e derivava a meio nó para a praia. Marquei a fiaxa de areia mais próxima como alvo e o GPS nos indicava que bateríamos na areia em torno de 14h00. 

Amarrei dois cabinhos na roda de leme, travando-a. Olhei para o Cassio, agradecido. Que sorte foi tê-lo ali! Sem alguém para fazer o leme adequadamente seria impossível ter mantido o veleiro no rumo certo. Dei um tapinha em seu ombro e falei: "- Com muito cuidado, vá lá para dentro". "- Tem certeza?", ele retrucou. Tenho certeza que passaria a noite toda ali comigo. Esse é o tipo de coisa que não tem preço. Ele entendeu meu silêncio, abriu a entrada da cabine e sumiu.

Fiquei no convés, sozinho. "- Frear o barco e preservar a estabilidade e a estanquiedade", pensei tremendo de frio, molhado até os ossos. Estava eufórico novamente. Hipotermia. Bati na entrada da cabine e pedi um casaco para o André. Ao vesti-lo, voltei a razão rapidamente. Joguei alguns cabos na água e uma das bóias circulares. Verifiquei se tudo estava fechado e entrei na cabine. Eram 04h30.

" - Pessoal, estamos capeando. O barco fica como uma rolha boiando no mar. Não há o que fazer. Estamos na melhor balsa salva vidas que e existe, só precisamos a todo custo evitar que embarque água aqui dentro. Pela manhã a coisa melhora e vamos para casa. Já já amanhece...".

Continua...






O mais longo dos dias - parte II


Ao chegarmos nas Ilhas o churrasco ainda não estava pronto, mas estava em vias de. Contraternizamos com as tripulações do Jazz IV, Meltemi, Easygoing, Grazina e Gaudério. Após umas duas horas deixei os meninos em terra se divertindo e fui ver  motor do Malagô. Mergulhei e limpei a admissão da água salgada. Estava um pouco suja, mas não obstruída. Depois desmontei a bomba d´água e troquei o rotor.O antigo estava perfeito. Verifiquei o óleo e estava tudo perfeito. Mas a água do radiador estava baixa. Procurei vazamentos, mas  só encontrei algum pela tampa. Improvisei uma vedação, mas não resolvia. Ainda assim a água que pingava era muito inferior a água perdida e nenhum grande vazamento era encontrado... Estavamos no pano mesmo. 

Logo uma ameaça de chuva surgiu no horizonte e as tripulações voltaram para seus barcos. O plano era ficarmos ali até a manhã seguinte. Enquanto o Ivan preparava um  almoço daqueles, ligamos para o Ricardo para tirar um sarro sobre o que ele estava perdendo. Ele não atendeu. Foi então que consultei a previsão do tempo...

Para o domingo a previsão era de poucos ventos, de quadrante sul e mar baixo. Mas na tarde do sábado havia a indicação da entrada de uma frente fria logo ao amanhecer do domingo, com ventos de SW na casa dos 20 nós na rajada. Considerando que o windguru sempre erra para menos, podia-se esperar problemas por vir.

Apesar da beleza do lugar alguns fatores o tornam inseguro para enfrentar uma tempestade. O primeiro e mais óbvio é que as Ilhas ficam muito próximas do continente e, para um barco em mau tempo, quanto mais próximo de terra mais perigoso é. O segundo é que o local é muito raso: lançamos ferro em três metros e meio! O terceiro é que a geografia dos morros forma um venturi, que intensifica o vento que entra. Vinte nós se transformam em quarenta muito facilmente. O quarto e último é que  estavamos de cara para o SW, como um amigo meu ficou um dia desses na praia do Soares, em Ubatuba. Não é, Walnei?

O Volnys, comodoro do passeio e VP da ABVC Santos veio a bordo e começamos discutir o que fazer. Não havia muitas opções. Deveríamos antecipar a partida para as19h30 daquele mesmo dia e  tentar chegar em Santos antes da entrada da frente.

Imediatamente eu entendi o que isso significava para nós, do Malagô. Sem motor, muito provavelmente pegariamos e entrada da frente bem de frente. Fiquei mudo e muito concentrado. Estabeleci que deveríamos tentar chegar no Indaiá antes e lá preparar um fundeio especial. Não é lugar mais abrigado do mundo, mas já enfrentei entrada de SW lá  sabia que se o fundeio fosse bem feito, o barco aguentaria. O Volnys chamou um a um no rádio para confirmar a intenção de partida às19h30. Na nossa vez, respondi apenas: "- Estaremos prontos".

Rizei a mestra na primeira forra. Olhei para a genoa, uma 120 de tecido leve. Pensei em trocar pela buja de trabalho, mais pesada emais adequada para o ventão. Porém estavamos em calmaria (mar espelhado) e precisavamos aproveitar cada ventinho leve que entrasse. Com a buja de trabalho isso seria impossível, pois ela não armaria e, mesmo que armasse, pegaria pouco vento. Seguimos com aquela mesma. Apertei manilhas, chequei cupilhas, preparei cabos solteiros, fechei gauitas e vigias.

Às 19h30 avisei o Volnys no rádio: "- Estamos indo. Não sabemos o estado do motor e eu prefiro enfrentar o vento boiando lá fora do que aqui, ainda mais sem vocês. Bons ventos para todos nós!".

Liguei o motor e seguimos. Ele estava frio, mas gradativamente foi esquentando, até que duas milhas depois, ferveu. Desliguei e olhei em volta.  Estrelas no céu, lua cheia, o Montão de Trigo no través, silencioso. Pelo menos já estavamos fora do baixio grande, um local em que não é bom se estar nas proximidades da Ilha das Couves.

O Easygoing passou por nós e a Célia nos encorajou. "- Vamos treinar para a Santos Rio" - brinquei tentando disfarçar. O Meltemi nos chamou no radio e nos ofereceu reboque. Mas rebocar um barco como o Malagô, com onze toneladas, por mais de quarenta milhas era inviável. Sei que o Alan estava preocupado com a gente, mas se eu aceitasse iria apenas colocar outro barco no meio do perrengue. Ele entendeu, mas senti que ficou com o coração na mão. O Gaudério nos chamou no radio e desejou boa sorte de forma muito gentil.

Tempos depois o Grazina passou e desejou que todos que enjoaram no dia anterior, enjoassem ainda mais... Pois é, o ser humano e sua grandeza interior. Mas interpretei isso como um "quebre uma perna" do teatro e seguimos em frente.  Quer dizer, boiamos. O vento morreu. As luzes de navegação dos outros barcos sumiam uma a uma no horizonte. Em pouco tempo estavamos por nossa própria conta.

Estabelecemos turnos. Comecei eu e o Ivan no convés e os outros foram dormir o máximo que poderiam. O Ivan disse: "- Primeira vez que velejo a noite". "- É bonito, não é?" - respondi. "- Tomara que seja a única coisa que você vê pela primeira vez esta noite" - emendei depois de uma pequena pausa.

O motor esfriava e nós completavamos o radiador. Na cabine apenas leds vermelhos acessos. Avançavamos duas ou três milhas na calmaria e desligavamos o motor fervente. Uma brisinha entrava aqui e ali e as aproveitavamos ao máximo. Foi assim até a meia noite, quando o Cassio acordou e me rendeu no leme. Eu não ia aceitar, mas achava que também precisava descansar,pois não sabiamos o que aconteceria e já estavamos ali há quatro horas e meia. 

O Ivan foi rendido pelo Rodrigo. É claro que eu não consegui dormir.Apenas fiquei parado, sem mexer um único músculo no beliche da cabine central. O Ivan ao meu lado, no outro beliche e o André na cabine de proa.Um ventinho entrou de sul, fraquinho. Começamos a velejar.

A 01h00 a retranca começou a reclamar.Fui lá fora e olhei para o horizonte. O céu a nossa frente, que antes estava claro e estrelado, trazia apenas um bloco de nuvens negras, em forma de charuto. Dei umas quatro ou cinco voltas na genoa e a deixei bem achatada. O vento entrou.

Continua...  









terça-feira, 19 de novembro de 2013

O mais longo dos dias... - parte I


Boas!

Como começar uma história longa sem ficar cansativo? Talvez haja apenas uma maneira: abordar o começo, o meio e o fim. Essa forma de contar essa história me veio à mente quando estava junto com minha tripulação trancado na cabine do Malagô, sendo violentamente jogado de um lado para outro a oito milhas ao largo de Bertioga.

Esse post, então, começa justamente pelo começo.


Nos dias 15, 16  e 17 de novembro passado a ABVC Santos organizou  o "Encontro das Ilhas", um microcruzeiro de tres dias saindo de Santos e indo até As Ilhas, litoral norte de São Paulo. Em princípio eu ia com as meninas, mas como a Priscila sempre arruma alguma coisa para fazer nessas horas acabei escalando outra tripulação: o André, o Ivan e o Ricardo Stark. Esse último no meio do caminho esqueceu que ia conosco e acabou sendo substituído pelo Rodrigo, inscrito na bolsa de tripulantes da ABVC. Também se juntou a nós o Cassio e isso, como veremos mais adiante, fez toda a diferença no desfecho da velejada.

Em rigor nenhumdsses tripualntes é velejador experiente e nenhum tem seu próprio barco. Mas também todos já tinham algumas milhas embaixo da quilha e  Cassio, dentre os quatro, era o que possuia maior log.


Saimos da sede náutica do Clube Intrnacional de Regatas às 10h00 do dia 15/11, seguidos pelo Meltemi. O vento entrou de leste logo pela manhã e percebemos que o caminho seria por uma estrada esburacada. Contornar a Ilha da Moela foi um parto e fomos alcançados pelos outros quatro barcos da flotilha. Depois a coisa andou bem e até nos aproximamos do resto da flotilha. Mas na  península (praia da enseada, Guarujá), entre vários golfinhos e "gorfinhos" de tripulantes enjoados, decidi abrir demais em direção ao mar aberto e com isso acabei andando duas milhas para trás. Erro meu, erro tolo. Nos desgarramos do grupo.







No final da tarde começamos a nos questionar se valia a pena seguir direto para as ilhas, navegando a noite atè às 22h00, quando bem pertinho estava o canto do Indaiá, onde poderiamos dar um mergulho, curar o enjoo e comer bem. Foi o que fizemos. Fundamos às 18h00, após uma velejada sensacional - apesar do vento contrário e sem esquecer do ditado que diz que apenas os regateiros e os idiotas navegam contra o vento...


O Ivan fez seu famoso "Macarron de Velerrô" e dormimos bem - cada um em sua cama, sem ninguem lá fora ou no chão dessa vez. Ah!  E sem nenhum mosquito!!!

No dia seguinte, às 07h00, suspendemos em direção ás Ilhas. Seguimos inicialmente  motorando, mas logo ao chegarmos no través da Riviera de São Lourenço o motor começou a esquentar de forma completamente anormal. O alarme disparou e não houve outra opção senão desligá-lo. O que fazer? Ora, somos Cuscos Baldosos! Vamos no pano mesmo!


Velejamos aproveitando o terral (través),que ora vinha com 18 nós, ora acalmava de vez. Não mexi no motor e ao meio dia nos encontramos com nossos amigos. Na verdade o que queríamos era chegar na praia apenas na hora do churrasco pronto, mas não iremos admitir isso nem sob tortura!

Continua...


(fotos retiradas do blog da ABVC/Santos)



segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Fomos lá...

Boas!

Os preparativos para a regata da marinha seguem a todo pano. No último final de semana realizamos um "treino em condições reais" com a equipe base: Juca, Luiz, Cassio, Aruã e Fabio (a Tamis está numa mega viagem ao redor do Brasil e enchendo sua página no face de fotos legais). Constou da equipe também - para minha alegria e graças a sogra (que ficou com as crianças), a Capitã Priscila!

A largada foi sensacional: estavamos milhas antes do lugar correto e parecia que não havia vento apenas para a gente, pois os outros veleiros voavam baixo, lá na frente. O Mala é um pouco pesado além da conta e sofre quando o vento acaba. E nessa regata o vento foi intermitente, de forma que se nosso avanço era de  seis nós em um momento, em outro nos arrastavamos a dois. 

A velejada foi super divertida e o objetivo primário foi alcançado: fazer a turma conhecer um ao outro e o equipamento. Aprendemos um bocado sobre o comportamento do barco e acho que no próximo treino já dá para tirar mais velocidade do danado. Você pode velejar todos os dias, mas só começa a velejar bem depois que compara seu desempenho com outros barcos, em uma mesma situação (mesmo sendo barcos tão diferentes). Completar a regata já foi uma vitória e terminamos em terceiro - e sim, havia apenas três barcos na nossa classe!

O SuperBakanna, nosso vizinho na Boreal.

Cassio, Aruã, Juca e Luiz.

Fabio, um mega proeiro que perdeu uns quatro quilos nessa regata.

Eles lá, nós cá...

A gente chegava perto deles, mas o vento acabava. Eles iam, nós ficavamos!

Duelo emocionaaaaante com o Jazz IV!

A festa na sede náutica do CIR.

A agenda de novembro segue lotada: nesse feriado tem encontro das ilhas, dia 23 tem novo treino e dia 30 faremos o último curso de vela do ano - a turma está quase completa, restam poucas vagas! Em dezembro teremos alguns eventos empresariais, com o pessoal da Velamar, da Náutica Tintas e da Borelli Corretora de Seguros. Há interesse? Traga o pessoal da sua empresa para velejar também!

E vamos no pano mesmo!


segunda-feira, 4 de novembro de 2013

O barco avisa...

Boas!

Quem nos acompanha deve se lembrar que a vela mestra, na volta de Ilhabela, apresentou problemas ao subir. Voltamos só de genoa, balançando feito loucos - pois sem a mestra em cima e na ausência de vento a estabilidade é prejudiciada - e chegamos sãos e salvos.

Matutei bastante sobre o problema e me dispus a subir no mastro para desentortar o carrinho do trilho (teoria que desenvolvi para explicar o assunto, sempre de olho na tal da navalha de Occam). Desde já agradeço aos meus alunos/amigos Cassio, Júlio e Flávia que mais de uma vez se ofereceram para ajudar nessa empeitada.

Alice "pecando"...

Contudo, todavia e entretanto o tempo foi passando e o vento se fez bem presente aqui. Era impossível subir no mastro com segurança e mais impossível ainda testar a subida da vela mestra, a não ser que tirassemos o barco da vaga para fundeá-lo ao largo, mas eu não estava com a mínima disposição para isso.

... embora na isca não houvesse anzol, rs.

Nisso  o tempo foi passando e eu comecei a pensar melhor... Ora, se fosse o trilho torto não subiria carrinho algum. A vela parava na metade enisso mais de uma dezena de carrinhos passavam. Era uma coisa seletiva? Não. O que havia de diferente, então, que eu não estava dando a devida atenção?!

Eureka!

Quando subimos o barco foi preciso retirar o estai de proa. Ao recolocá-lo eu intencionalmente dei muito mais voltas no estai de popa, deixando o de proa bastante caçado. Nisso a curvatura do mastro aumentou severamente e era de se esperar uma travada logo na metade da vela, justamente o que acontecia! A orça melhorou um bocado (efeito de se colocar o mastro mais a ré), mas de que adianta orçar sem velas? 

O Malagô, visto do Goludo - Foto Jefferson Neitzke

O que eu não me dei conta foi que o barco tinha me avisado isso uma semana antes! Quando velejamos no dia da sáida do Pier 26 a catraca que recolhe o cabo de aço que é a adriça da vela mestra se soltou do mastro e foi parar lá em cima. Aquilo era o aviso: "Seu trouxa - disse o "Mala", em linguagem corporal explícita - esse mastro está com muita curvatura à ré!". Mas eu, claro, não entendi o que ele me disse e me estrepei. Um barco sempre avisa quando algo está errado. Ele faz um barulho diferente, treme diferente e até quebra (e quebra seu saldo bancário). Não é à toa que os bretãos muito sabiamente os consideram She...
Ah, essa vida dura!  - Foto Jefferson Neitzke.
Ao longo dessa última semana, então, me dediquei a recuperar a catraca voadora e a instalar algumas das pecinhas maravilhosas da Harken que o Paulo, do Bepaluhê, me enviou para acabar com meu sossego!!!

Nossa estadia na Boreal tem sido excelente. Voltamos a socializar com velejadores e até com lancheiros (estes devidamente doutrinados pelo comodoro Alan Trimboli, do Meltemi). A Alice vive para lá e para cá (aprendeu a pescar!) e sempre encontramos um amigo ou recebemos visitas.

Na sexta foi a vez do Olavo, da Sun Sails, que foi medir o barco para a conclusão da gennaker (toda vermelha dessa vez); no sábado, no nosso contrabordo, recebemos o Elder, o Russo e o Cardoso do Ranger 22 YES; no domingo, quando enfim consegui sair com a Prscila, a Brida, a Alice e a Ayla (amiga pré-teen da Brida), dentre tantos barcos conhecidos o destaque foi o Goludo (Atoll 23), do Jefferson. Fomos só até ali: no motor, fundemos no Sangava e lá ficamos até que... voltamos. A entrada na vaga rendeu aplausos - acho que pegamos o jeito.

Nosso novo projeto agora são as regatas em Santos. O alvo central é a da Marinha, mas nesse sábado iremos participar da 7ª etapa do Santista de Oceano, organizado pelo CIR. Dia 30/11 faremos o último curso básico do ano e já estamos com o calendário 2014 preparado e cheio de supresas! Haverá até cruzeiro pela Ilha Grande!!!

E é isso, vamos no pano mesmo!